Tenho a impressão, para não dizer a certeza e cair logo no óbvio, de que quanto mais tento consertar as coisas, mais consigo estragar tudo. Neste fim de semana, por exemplo, ia receber visita na minha casa, o que por si já me causou todo tipo de ansiedade e receio. Moro em uma casa antiga e meio que caindo aos pedaços, cheia de coisa para arrumar que fui adiando por motivos de falta de grana e por quê casa velha tem seu próprio feng shui e não gosta de ser bulinada.
Um exemplo disso foi que assim que me mudei tentei colocar para funcionar uma tomada no banheiro e com isso acabei desligando a energia da cozinha. Não encontrei a relação, nem meu irmão que é realmente eletricista encontrou uma, então simplesmente desligamos a tomada e a vida seguiu assim.
Foi meio parecido quando cortei um cano no telhado que ligava nada a lugar algum e acabei deixando o vizinho sem água um dia inteiro. A grana que eu gastei para conseguir um encanador de última hora ainda me faz acordar chorando no meio da noite, mas a culpa tinha sido toda minha e eu acreditei que era uma punição pedagógica. No bolso a gente sempre aprende.
Foi por isso que quando fui resolver o problema da falta de pressão da caixa d’água, resolvi chamar um profissional. O problema veio com a casa. O chuveiro pingava e esquentava demais, uma reclamação antiga que provocou até um pouco de stress com a ex-namorada e que depois de muito pesquisar resolvi ajeitar com uma simples válvula de pressão na caixa d’água. Como não tinha ideia de como fazer a instalação e francamente não queria olhar o estado da caixa d’água, chamei um encanador para fazer o trabalho. Preço justo, serviço feito, comecei a me sentir idiota por tentar resolver as coisas, ao invés de pagar para alguém que realmente sabia o que estava fazendo, porém a casa… a casa, tinha sua própria opinião e bastou eu começar a sorrir depois da primeira ducha descente sob aquele teto, para o disjuntor de energia desarmar e eu acabar meio-ensaboado, enrolado na toalha, no portão da minha casa, xingando até a quinta geração do desgraçado que construiu aquela maldição. Outro dia cinzento no meu inferno pessoal.
Tentei resolver chamando um eletricista, mas eles me evitavam, como se soubessem de algo que eu não sabia. A solução improvisada que encontrei foi reduzir a pressão do registro, voltar aos banhos fumegantes e fingir que aquilo não me irritava, mas confesso que depois daquele golpe, eu tinha desanimado.
De todos os problemas que eu tenho na casa, certamente o que me incomodava mais era o banheiro. Tudo funciona, mas do seu próprio jeito. A pia é muito baixa, o box muito escuro, a luz está no lugar errado e tinha o diabo da caixa d’água do sanitário, que era uma peça de museu abandonada por Dom Pedro, amarrada com fio de varal e meio torta. Um troço feio, disfuncional que fazia tudo para me provocar TOC.
Pode não parecer, mas a verdade é que eu odeio gambiarra. Essa história de reparo de improviso. Sou da opinião que quando você faz uma gambiarra ela vai perdurar até dar problema de novo. Nenhuma gambiarra é provisória, ela é um câncer que se instala e se multiplica, até que alguém se esqueça dela e faça alguma merda que coloque tudo abaixo. Sempre que vejo algo errado, quero que seja resolvido da melhor forma e sabendo desse meu desvio, pensei duas vezes antes de me mudar para uma casa antiga, mas aqui estamos. A casa. O banheiro. A caixa d’água do sanitário.
Eu receberia visitas no sábado. O que por si já me causava uma série de gatilhos de ansiedade. Quantas pessoas, onde vão se sentar, o que vão comer, o que devo preparar, a casa está limpa, as cachorras perfumadas. O inferno, o inferno, o inferno! E entre todos os problemas dessa casa velha, eu decidi que pelo menos a caixa d’água precisava ser resolvida. Questão de honra! Não era nenhum bicho de sete cabeças, nem trabalho para um engenheiro, mas com todo aquele histórico e com o objetivo de receber as pessoas em mente, resolvi que preferia pagar para não ter aquela dor de cabeça e liguei para aquele encanador que já tinha feito um serviço anterior, marcamos um dia e eu esqueci do resto.
Acontece que o encanador não veio e quando me dei conta, já era sexta feira. As visitas para o dia seguinte estavam confirmadíssimas e nem me passou pela cabeça a hipótese de adiar tudo por para a próxima semana, afinal, eu tinha as peças, as instruções e o youtube. Se o encanador não tinha aparecido, era dinheiro guardado para um churrasco.
Acordei cedo, limpei a casa, varri o quintal, refiz a lista de compras e na ordem de tarefas resolvi que era melhor fazer a bagunça do banheiro antes de lavá-lo. Li o manual todo de novo, assisti mais uma vez a instalação da peça no youtube e tirei a furadeira do meu avô do armário, mais antiga do que eu, talvez tanto quanto aquela casa, uma arma ancestral para enfrentar um demônio milenar.
Medir duas vezes e furar uma vez. O conselho do meu avô era cheio de sensatez e eu o obedeci à risca. Medir duas vezes e furar uma vez e nessa única vez acertar um cano que estava onde não deveria estar.
Água, gritos, raiva. Um escorregão e queda, o ego dolorido e a pressa em fechar os registros. Ensopado, no meio da piscina que tinha se tornado o banheiro, eu peguei o telefone e desmarquei as visitas. Pedi desculpas, garanti que daria certo na próxima e que seria ainda melhor. Depois comecei a romaria em busca de ajuda. No fim da lista, o encanador que não tinha aparecido.
Foi ele mesmo quem atendeu e veio. Olhou tudo, pensou um pouco, resolveu o que podia, do jeito que deu, uma nova gambiarra para consertar a gambiarra antiga. Quando ele foi embora, eu estava muito mais pobre, com fome, cansado e com o banheiro imundo, que quase lavei com as minhas próprias lágrimas.
A parede esta toda arrebentada, a nova caixa d’água foi colocada torta, não sei se vou conseguir tirá-la do lugar, pois algumas peças foram coladas. Não sei como vou rebocar a parede sem tirá-la do lugar. Parece tudo pior do que era antes, um alerta para não mexer em nada. Depois de limpar tudo e finalmente comer, resolvi tomar um banho e encerrar o dia. A pressão da água desmontou o disjuntor.
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