Como continuação do artigo sobre Grimdark, resolvi explorar um gênero similar que muitas vezes causa confusão entre os leitores.
Antes é preciso explicar que existem inúmeros especialistas, gente que passou a vida estudando literatura como uma ciência, questionando as fronteiras de Dark Fantasy, Horror, Grimdark, Alta Fantasia e outros gêneros, empenhados em achar uma forma de classificar uma obra e que eu não sou um deles. Não cabe a mim dar uma palavra final sobre o assunto, apenas apresentar algumas ideias e formular algumas propostas, ou tentar mostrar a forma como eu vejo as coisas. Se o artigo lhe for útil fique a vontade para comentá-lo, questioná-lo ou divulgá-lo; caso contrário apenas descarte-o, a vida é curta para se prender em rótulos.
Dark Fantasy é outro subgênero da fantasia que, como falamos, às vezes é confundido com Grimdark. Mesmo entre estudiosos a fronteira entre os dois gêneros parece tênue, com autores transitando de um lado para o outro de forma a confundi-la ainda mais. Existe um consenso geral, porém, em como cada gênero lida com os elementos sobrenaturais: enquanto no Grimdark o sobrenatural e o fantástico estão sempre sobre o controle do ser humano, no Dark Fantasy os elementos sobrenaturais exercem força maior sobre os homens, pairando sobre eles como algo muito além do seu controle, nesse caso, tornando o gênero muito mais próximo das histórias de horror.
Se no Grimdark existe a preocupação de manter os seres humanos como foco principal, tornando-os ao mesmo tempo e de forma equilibrada como os maiores heróis e vilões da história (com cada personagem representando ao mesmo tempo o melhor e o pior do ser humano), no Dark Fantasy existe essa “força sobrenatural superior” que a todo momento ameaça a integridade humana. Em exemplo: no Grindark os personagens são ameaçados por um feiticeiro capaz de controlar os poderes do inferno, já no Dark Fantasy, o inferno é uma força incontrolável que será sempre uma ameaça maior, colocando todos em risco.
O medo deste sobrenatural é a própria essência do Dark Fantasy, não por menos o site Best Fantasy Books o definiu como:
Um subgênero fantástico que combina elementos da fantasia e do terror. O termo Dark Fantasy é normalmente usado para se referir as histórias de horror e fantasia sobre criaturas demoníacas, múmias, vampiros e similares.
James Landrith parece concordar, quando diz que os enredos da Dark Fantasy envolvem o medo, o horror, o sobrenatural e elementos psicológicos, com batalhas dramáticas contra algum tipo de perdição inevitável e/ou uma luta do personagem para manter sua sanidade.
Assim como Grimdark – e talvez daí venha um pouco da confusão entre os gêneros – a Dark Fantasy não promete finais felizes ou uma vitória do bem contra o mal, mas enquanto no Grimdark não existe essa definição entre luz e trevas, já que explora personagens que possuem um pouco de ambos, o Dark Fantasy, por outro lado, parece se dividir entre o bem (ou ao menos um bem relativo) e o pior. Um horror maior e inominável por quem é impossível se afeiçoar.
Outra característica do Dark Fantasy, segundo Landrith, é a presença de personagens sobrenaturais que podem ou não ser fruto da imaginação de outros personagens, às vezes se tornando dúbios. Vampiros, lobisomens, demônios e fantasmas são elementos comuns nas obras do século XIX e chegaram até os dias de hoje através da literatura e em adaptações para a televisão e cinema.
Para Landrith o sentimento que melhor explica a Dark Fantasy é o medo. Para tanto, ele relembra a celebre frase de Stephen King sobre Horror e Dark Fantasy:
Eu reconheço o terror como a melhor das emoções e por isso vou tentar aterrorizar o leitor. Mas se eu descobrir que não posso aterrorizá-lo, vou tentar horrorizá-lo e se eu descobrir que não posso horrorizá-lo, eu vou enojá-lo. Não me orgulho disso.
Para o autor do artigo, essa frase é uma clara demonstração de que o caminho particular da Dark Fantasy talvez possa variar, desde que chegue ao mesmo resultado final. É da sua opinião que esse subgênero da literatura fantástica possa ser diversificado em métodos, caracterizações e configurações, o que só o tornaria ainda melhor.
Importante também lembrar da distinção de Colleen Anderson entre Dark Fantasy e Horror: enquanto o Terror se ocupa exclusivamente de causar medo, no Dark Fantasy esse medo é algo que fica sob a superfície, transitando através da história como apenas mais um dos seus elementos.
Michael Moocock talvez seja um desses autores que tenha transitado entre diversos gêneros. Suas histórias são comumente classificadas como Espada e Feitiçaria, mas existe no seu trabalho bastante do que hoje é chamado de Dark Fantasy.
O maior erro que um leitor pode cometer é tentar classificar um livro dentro de um gênero ou subgênero de forma absoluta. Ao autor não cabe, necessariamente, cumprir essa tarefa. Dentro de um catálogo de obras, ou mesmo dentro de uma única obra, o autor pode carregar elementos de quantos gêneros achar necessário para tornar a história interessante. Então, é possível que dentro de uma novela Grimdark você tenha passagens mais próximas do Dark Fantasy, do Horror, do Drama ou da Comédia (porquê não?) o mesmo vale para qualquer outro gênero.
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