Eu olhei para o dinheiro na minha carteira e sorri. Tinha lido uma pesquisa um tempo antes que dizia que encontrar dinheiro inesperado era uma das coisas que mais alegravam as pessoas. Se o dinheiro fosse em libra, então, devia ter um gosto especial. Subitamente eu havia passado do meio do mês e agora tinha dinheiro na carteira. Todas as contas estavam pagas. Todas as previsões tinham sido feitas. O cartão de crédito cobriria a diferença no que o dinheiro não desse conta e eu tinha uns belos trocados a mais, esperando para serem gastos livremente. Então eu fiz o que qualquer pessoa entediada em um domingo, com dinheiro no bolso faria. Fui ao shopping.
Não tinha planos. Fui até uma loja de tênis e examinei as coisas sem pressa, pensando que finalmente podia comprar um tênis de corrida para minha tentativa fracassada de fazer academia, já faziam alguns meses que eu usava um tênis velho e sem solado que não ajudavam em nada a mortecer o impacto. Depois de certa idade a academia se tornava uma obrigação. Pensei novamente e eu não queria gastar meu dinheiro com algo que me desse tão pouco prazer. Não era muito dinheiro, mas era meu e eu queria que se tornasse algo bom. Fui ao cinema e para minha tristeza eu já tinha visto todos os filmes que interessavam. Passei pela livraria mais uma vez com culpa, sabendo da pilha de livros não lidos que eu tinha acumulado ao longo do ano e desisti de uma loja de roupas antes mesmo de chegar a porta, sabendo que não havia nada que eu precisasse menos do que camisetas e calças. Discos, brinquedos, eletrônicos, perfumes… nada me interessava, mas tudo me lembrava alguém. Um presente para um amigo, uma lembrança para minha ex namorada, um calçado para minha mãe… eu tinha dinheiro sobrando, pela primeira vez em muitos e muitos meses e não sabia como gasta-lo comigo.
Segui pelos corredores do shopping mais um pouco, como se pudesse ignorar o vazio. Não o vazio das lojas amarrotadas, dos produtos empilhados, daquela vez, não o vazio da minha carteira. O vazio que havia em mim e que eu não sabia com o que preencher. Foi a primeira vez que me dei conta de como eu desejava pouco da vida. Uns filmes, alguns livros, um restaurante interessante e uma viagem de fim de ano. Mais nada. Nenhum passatempo, nenhum sonho. Nada em que empenhar um dinheiro que eu não devia ter. Me dei conta de como eu tinha gastado minha vida nos últimos anos, vivendo o sonho dos outros, realizando os desejos dos outros, me empenhando em pagar o que os outros achavam que eu deveria ter, sem nunca pensar em mim mesmo. Terminei o dia comprando um grande espelho que levei para casa. Grande o suficiente para eu me olhar e me odiar todos os dias e tomei um café com biscoitos. Foi o melhor que eu pude pensar para mim mesmo. Um espelho cego e um biscoito.
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