Essa noite tive um sonho. Estava morto e não fazia muito tempo. Vaguei por uma estrada fria, no contorno de uma montanha procurando o caminho de casa e a encontrei em um terreno inclinado, depois de um rio turbulento, povoado por crocodilos que devoravam vacas. Do outro lado do rio ficava minha casa e era como todas as casas que eu já tive, o centro de todo um universo. Ao entrar eu estava sendo esperado, todas as pessoas que já tinham morrido estavam ali me aguardando, mesmo alguns que eu não tinha visto morrer estavam ali por mim, pois o tempo era matéria da carne e não significavam nada ao espírito e a cada novo morador nós recebíamos com brindes, comida, palavras carinhosas e memórias da vida. Pelas nossas pernas corriam todos os cães que eu já tinha tido, todos os gatos com quem brinquei e não havia o menor sinal para lágrimas. Quando alguém anunciava uma chegada, ficávamos todos ansiosos esperando quem mais estaria chegando e quando alguém anunciou meu filho, eu chorei pois eu tinha muitas saudades e esperava revê-lo desde que ele tinha falecido. E porquê demorou tanto? Onde esteve esse tempo todo que deu tempo até deu chegar primeiro? Aquilo nada significava, para quem vivia longe do tempo. Quando a manhã me alcançou eu estava sorrindo. Ainda me lembrava dos sorrisos, dos abraços, da saudade. Do rio na porta que girava em círculos, com crocodilos e vacas e pensei que não era tão ruim morrer assim.
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